15/03/2016

Soteriologia Social de John Wesley.



Texto Helmut Renders - Teólogo e Pastor Metodista. 

Em John Wesley, coração e vida são os loci da santidade interior e exterior: “Esta santidade interna e externa, esta conformidade tanto do coração como da vida para com a sua vontade, deveria ser perfeitamente gradualmente.” Ou: “ A beleza da santidade interior, daquela do ser humano do coração que é renovado segundo a imagem de Deus...” Ou: “ O que você acha que santidade é? É pureza tanto do coração como da vida. É a mente que estava em Cristo, capacitando-nos a andar como ele andou. É amar ao próximo”. A Fé em Cristo não ignora a lei, mas leva a produzir todos os tipos de santidade, de forma negativa e positiva, do coração e da vida. Em outras palavras, a capacidade e a vontade de deixar o mal (negativo) e fazer o bem (positivo) São desenvolvidas e amadurecidas.
No sermão 76, Sobre a perfeição, John Wesley refere-se à sintonia entre coração e vida como a justiça interior e exterior, que, de fato, aproximam justificação e justiça.


Este conceito duplo e transversal nas obras de Wesley enfatiza  a coerência entre a experiência religiosa e a práxis. À luz dessa experiência transversal na coerência entre convicção e vida, as passagens que desafiam a religião exterior em favor da religião interior devem ser interpretadas como acento na experiência e conhecimento da primazia da graça.

A mudança interna capacita para realização da justiça externa, a andar como cristo andou, pela obra da fé, paciência da esperança e pelo trabalho do amor. Enfim, todas as “coisas externas”, por exemplo “cerimonias e ritos”, sejam eles excelentes, decentes, uma ajuda, ou mandado do próprio Deus não representam a religião verdadeira, a qual consiste em misericórdia, humildade e mansidão(justiça interior) e um zelo pelas obras que não quer machucar ou entristecer ninguém e que usa qualquer oportunidade para fazer o bem(justiça exterior). Aqui significa “coisas externas” a manutenção da forma sem vida, enquanto a justiça interior e exterior são entendidas como dinâmica complementar.

A distinção entre obras de misericórdia e piedade, amplamente introduzida na teologia anglicana, é transversal nas obras de Wesley. Raramente, ele substituiu “obras de misericórdia” por “obras de caridade” talvez com base em Willian Law que escreve “obras de necessidade” ou “obras de benevolência”. O uso paralelo de atos e obras feito por Law, no seu Um chamado sério, não é acompanhado por Wesley que mantem a firme relação entre devoção e ação, fazendo dela o eixo fundamental  das regras gerais. Nelas, as obras de misericórdia compõem a primeira parte (deixar o mal e fazer o bem), e as obras de piedade, segunda (observar as ordenanças de Deus). Apesar disso, Wesley nunca estabeleceu uma única ordem entre as obras de misericórdia e as de piedade; diferentemente, ele enfatiza sua vinculação: “o amor a Deus leva naturalmente a obras de misericórdia; da mesma forma, o amor ao próximo leva a obras de piedade. A falta de um impede a perfeição e o crescimento na graça.”

Portanto, o ser humano é uma unidade da qual fazem parte corpo, alma e mente. O fazer o bem e deixar o mal das regras gerais tem um sentido mais amplo ou, talvez melhor dizendo, mais integrado do que um envolvimento na sociedade humana em favor da garantia da sua physis.
A distinção entre obras de misericórdia e obras de piedade é a responsabilidade da comunidade com a integridade das vidas dos outros e a vida da comunidade em relação ao Deus vivo, usando os meios da graça estabelecidos por Ele.


 John Wesley rejeita a tradução da palavra grega ágape como caridade, pois limita o sentido da palavra a um ato exterior de dar esmolas. Para Wesley o capitulo 13 de coríntios fala do amor da benevolência, de uma boa vontade, amorosa em favor de cada vida criada por Deus, ou seja, uma atitude geral que estabelece relações. Consequentemente, ele mantém isso na sua tradução do Novo Testamento de 1790, enquanto a versão King James continuou privilegiando o termo caridade.

Esta escolha não pretendia reduzir a pratica ao mero sentimento de amor ou substituí-lo por uma boa intenção. Isso é um problema depois do século XVlll. Tal situação torna mais clara pelo uso paralelo que John Wesley faz dos termos Obra s de misericórdia e obras de piedade, amor ao próximo e a Deus e santidade interna e externa.  O que esta em jogo para ele, é que o amor ao próximo não deve ser reduzido à mera ação exteriorizada, sem atingir o ser humano na sua totalidade. Justiça por exemplo, sempre precisa da misericórdia, porque nenhuma lei abrange todos os aspectos da vida. Mas isso só é possível quando os agentes da fé atuam com compaixão verdadeira, vinculados a fonte mais duradoura e forte desta atitude em relação ao outro – O amor de Deus.

A insistência na insolúvel relação do duplo mandamento do amor  origina-se na convicção de que relações mútuas  de cuidado devem ser criadas para proporcionar o real crescimento e maturidade na fé como caminhada cristã. Assim na sua carta sobre a proclamação de Cristo, Wesley sintetiza a sua doutrina como proclamar o evangelho e pregar a lei, e esclarece que a lei pode ser resumida pelo sermão do monte. As duas ênfases promovem a santidade do coração e da vida.

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